Josias de Souza 24/12/2013 04:52
A governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PMDB), perdeu a autoridade sobre um pedaço do território do seu Estado. No Complexo Penitenciário de Pedrinhas, em São Luís, quem manda é o crime organizado. Essa espécie de terceirização do cadeião maranhense às facções criminosas será retratada em relatório a ser entregue nas próximas horas ao presidente do STF, Joaquim Barbosa, e ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
Chama-se Douglas de Melo Martins um dos redatores do documento. É juiz auxiliar da presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Após visitar a penitenciária de Pedrinhas, ele adicionou ao rol de mazelas já colecionadas em inspeções anteriores uma novidade macabra: mulheres e irmãs de presos são forçadas a manter relações sexuais com chefes das facções criminosas que controlam a cadeia: o Primeiro Comando do Maranhão e o Bonde dos 40.
“As parentes de presos sem poder dentro da prisão estão pagando esse preço para que eles não sejam assassinados”, relata o doutor Douglas. “É uma grave violação de direitos humanos.” A atmosfera de caos facilita os estupros. No presídio do Maranhão, a tradicional separação dos presos em celas não existe mais. As grades foram arrombadas em rebeliões. Grupos de 250 a 300 presos compartilham suas iras e angústias misturados nas galerias.
Não há nesse inferno prisional espaço adequado para as visitas íntimas, tal como previsto em lei. O bom senso recomendaria que, em tais circunstâncias, os contatos físicos dos presos com suas mulheres e namoradas fossem suspensos. Não foi o que sucedeu no complexo de Pedrinhas. A direção da unidade não teve pulso para proibir as relações sexuais. Elas ocorrem ali mesmo, nas celas abertas. Por quê? Ora, porque os mandarins do crime querem que seja assim.
“Por exigência dos líderes de facção, a direção da casa autorizou que as visitas íntimas acontecessem no meio das celas”, conta o juiz Douglas Martins. Em contato com o secretário de Justiça e da Administração Penitenciária do Maranhão, Sebastião Uchôa, o enviado do CNJ pediu providências. O auxiliar da governadora Roseana “prometeu acabar com a prática”. Vivo, Garrincha perguntaria: ‘Já combinaram com o Primeiro Comando do Maranhão e o Bonde dos 40?
O olheiro do CNJ trouxe do Maranhão outra evidência de que o Estado manda pouco, muito pouco, quase nada na penitenciária de Pedrinhas. A inspeção dos visitantes só alcançou as áreas que os presos consentiram. “Como as celas não ficam fechadas, os agentes de segurança recomendaram não entrar”, relata o magistrado Douglas Martins. Por quê? Os barões da cadeia não autorizaram. “Seria muito arriscado”, declara o juiz.
Apenas no ano de 2013, estima-se que morreram na penitenciária do Maranhão mais de 50 detentos. Na penúltima rebelião, ocorrida na semana passada, feneceram cinco, três deles com as cabeças apartadas dos respectivos pescoços. Foi a imagem medieval das decapitações que levou o CNJ de volta às mazelas de Pedrinhas. Acompanhou o doutor Douglas um representante do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), o conselheiro Alexandre Saliba.
Na última sexta-feira (20), em visita à governadora Roseana Sarney, Alexandre Saliba entregou-lhe ofício remetido pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. No texto, o chefe do Ministério Público Federal requisitou informações sobre as providências eventualmente adotadas para deter o descalabro do sistema prisional. Deu três dias de prazo para o envio de uma resposta. Roseana disse a Saliba que atenderá à requisição de Janot nesta terça-feira (24) natalina. Será?
Conforme já noticiado aqui, Janot cogita requerer ao STF a decretação de uma intervenção federal no Maranhão. O descontrole da penitenciária de São Luís vem sendo atestado por emissários de Brasília desde 2011. Pressionando aqui, você chega a um relatório referente à inspeção anterior à que ocorreu na semana passada. Deu-se em outubro de 2012, nas pegadas de outra rebelião, que levou à cova dez presos.
O documento faz menção a uma audiência dos inspetores com Roseana Sarney. Nessa reunião de um ano e dois meses atrás, a governadora prometera erguer 11 novos presídios em seis meses –um em São Luís e outros dez no interior do Estado. Entre uma rebelião e outra, com a promessa da governadora de permeio, nada mudou na cadeia de Pedrinhas. A penitenciária continua sendo o melhor local para a construção de um Maranhão inteiramente novo. Caos não falta.
Fonte: Blogue do Josias de Souza
http://josiasdesouza.blogosfera.uol.com.br/
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