A burisse americana
Lucas Mendes
De Nova York para a BBC Brasil
Os americanos não eram burros. A burrice começou na década de 70, culpa de políticos oportunistas e, maior ainda, dos sindicatos dos professores de escolas publicas que conseguiram proteções e vantagens extraordinárias como a estabilidade, uma espécie de cátedra. Depois de três anos de trabalho, é quase impossível demitir um professor de uma escola pública.
Os salários são baixos. A maioria dos professores são atraídos pela moleza: mais dias de férias, poucas horas de trabalho e pensões generosas, mas a profissão atrai um numero baixíssimo de bons universitários. Nos três países líderes em educação - Finlândia, Cingapura e Coreia do Sul - os professores vêm da nata das universidades, têm salários altos e prestígio social.
Entre os trinta países “avançados”, os americanos, que já foram primeirões em educação, estão lá atrás em ciências e matemática.
A Finlândia, medalha de ouro em educação, estava muito pior que os Estados Unidos. Em uma geração, tornou-se campeã, com um esquema de três professores por sala com um custo de US$ 3 mil a menos do que cada aluno americano.
Estes são alguns dos fatos que você aprende num devastador documentário sobre a educação nos Estados Unidos dirigido por Davis Guggenheim. Seu filme anterior, Uma Verdade Inconveniente, sobre o envenenamento do planeta - ganhou o Oscar e seu inspirador, Al Gore, ganhou o Prêmio Nobel.
Depois do Oscar, ele recusou dezenas de propostas para focalizar outros problemas, mas, todas as manhãs, quando levava suas filhas para uma escola particular cara, em Venice, na Califórnia, passava na frente de três escolas públicas americanas e se sentia culpado.
Por que aquelas crianças nas escolas públicas não podiam ter a mesma educação que as filhas dele? Por uma daquelas escolas passavam 60 mil estudantes em quatro anos e só vinte mil se formavam. Um estudante americano que não termina o curso secundário tem oito vezes mais chances de ir para a prisão. Na Finlândia só 2% dos estudantes não se formam.
Um dos principais personagens do filme e que deu origem ao título do documentário Waiting for "Superman" é Geoffrey Canada, um líder comunitário que ficou conhecido no país pelo seu ambicioso projeto social “Harlem Children Zone”, que engloba 97 quarteirões decadentes do Harlem, inclusive suas escolas “charter”.
Geoffrey era um aluno problemático e preguiçoso. Quando perguntaram a ele quando ia sair das suas trapalhadas, respondeu: "estou esperando o Super-Homem". Ficou arrasado quando descobriu que seu herói não existia.
Educação é parte essencial da reforma dele no Harlem. O documentário acompanha cinco crianças de diferentes regiões, quase todas pobres, que querem sair das escolas públicas para escolas “charter ”, mas, como há muito mais procura do que vagas, os alunos entram por um sistema de sorteio. Este é um dos pontos cruciais e dolorosos do filme: para a maioria das crianças, o sonho americano depende de uma loteria.
A diferença entre uma escola “charter” e uma pública é o sindicato. O dinheiro das públicas e das "charters" vem do Estado, mas a direção da escola "charter" demite os incompetentes, contrata e paga extra aos bons professores, exige horas extras durante a semana e nos sábados, reduz dias de férias. O sindicato não dá palpite. Na base do mérito alguns professores podem ganhar US$ 150 mil por ano em vez de US$ 50 mil.
A revolução na educação americana foi impulsionada, em parte, pelas escolas “charters”, pelas reformas e estímulos de prefeitos como Bloomberg, de Nova York, e Barack Obama, inimigos do sindicato. Obama foi o primeiro presidente democrata desde a década de 70 que confrontou os sindicatos e se elegeu sem o apoio da AFT, American Federation of Teachers.
Waiting for "SuperMan" dá um choque mais forte nos americanos do que Uma Verdade Inconveniente pela urgência e proximidade do problema. Esta geração mal educada não tem futuro e não ha polêmicas científicas. As crianças semi-alfabetizadas estão dentro de casa. Dia e noite, americanos são bombardeados pelo próprio fracasso e pelo sucesso dos outros países.
A solução, em resumo, é o bom professor, mas o que faz um bom professor é um mistério que Bill Gates está pagando US$ 500 milhões para descobrir com pesquisas e câmeras instaladas em milhares de salas.
Paulo Blikstein, professor em Stanford, na Califórnia, é um brasileiro considerado gênio em educação:
"A figura clássica do bom professor é aquele que explica bem, que anima a sala, o professor-ator. No modelo tradicional, o importante é transmitir informação, mas, hoje, o professor torna-se muito mais um orientador de aprendizagem do que alguém que faz malabarismos em aula. A era da educação massificada acabou, a boa educação terá de ser cada vez mais individualizada. "
"Em vez de ser o único lugar de acesso ao conhecimento, a escola passará a ser muito mais um agregador e direcionador de várias atividades de aprendizado, presenciais e em rede, curriculares e extra-curriculares. Difícil, mas nada que não se consiga em 20 anos", diz Blikstein.
Ótimo. Em 2030, teremos o estudante brasileiro finlandês.
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